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O MASSACRE DE LOS ANGELES
A tragédia começa



O triste episódio foi realmente um espelho daqueles tempos e lançou uma luz opaca e terrível sobre a cidade em crescimento. Aconteceu na "Calle de los Negros", o gueto mais pobre de Chinatown, onde, misturados às lavanderias, empórios e pequenas atividades comerciais, mexicanos e chineses, os imigrantes menos apreciados pela população norte-americana, viviam em contato próximo. Os anais da época descrevem-na como “uma zona dura, com uma longa estrada de terra com cerca de doze metros de largura repleta de bordéis, casas de apostas, empórios e residências de lama e palha”. A população era predominantemente masculina, dadas as leis norte-americanas que limitavam a imigração de mulheres chinesas. Porém, a máfia conseguia infiltrá-las, quase sempre com a ajuda das autoridades locais. Desse modo, entre famílias e prostitutas, a população chinesa da Calle de los Negros cresceu cerca de 200 vezes em apenas dez anos e prosperou maravilhosamente. Gerando um forte clima de descontentamento entre a população branca, afligida pela recessão do pós-guerra e ciente de não conseguir acompanhar os preços baixos e as exaustivas horas de trabalho dos comerciantes chineses, que também mergulharam toda a área no vício.

A tragédia batia à porta e estourou pontualmente em 24 de outubro de 1871.

Fontes oficiais relataram a desculpa usual como a causa do linchamento. Ou seja, o assassinato de um xerife local, Robert Thompson, durante um conflito com a máfia chinesa. O que aparentemente despertou a raiva da multidão (!) a ponto de torturar, mutilar e enforcar cerca de vinte pobres miseráveis chineses pegos ao acaso.

As justificativas já não se sustentavam e, se adicionarmos ainda que, após um julgamento ridículo, apenas oito pessoas foram identificadas como culpadas do massacre, inicialmente acusadas de "homicídio culposo" e então completamente absolvidas — embora testemunhas tenham indicado elas e trinta outros sujeitos como responsáveis pelo ocorrido —, fica claro que algo estava errado.

Comecemos dizendo que o massacre não foi um evento repentino, mas sim que alguns fatos anteriores contribuíram para alimentar as tensões e o ódio entre norte-americanos e chineses. Reuni muitas informações do livro The Chinatown War, que recomendo que você leia.

Poucos dias antes, o chefe de um dos vários clãs da máfia chinesa, um certo Yo Hing, havia organizado o sequestro, motivado por dinheiro, de uma das poucas mulheres casadas em Chinatown. Chamava-se Yut Ho e diziam ser belíssima.

Isso foi possível, porque Yo Hing tinha estreitas relações financeiras com as administrações locais, principalmente os xerifes e os oficiais da lei, que não apenas fechavam os olhos aos crimes, como também recebiam uma grande porcentagem dos lucros.

É claro que a facção rival, representada pelo chefe e comerciante de tecidos Sam Yuen, não engoliu o insulto, que minava seu poder local. Com a ajuda de outras autoridades norte-americanas, Yuen conseguiu desembarcar em São Francisco uma gangue de guerreiros Tong recém-chegada da China e armada até os dentes.

Na noite de 23 de outubro, o esquadrão de assassinos liderado por Ah Choy, irmão da mulher sequestrada, iniciou um tiroteio contra Yuen. Sam Yuen saiu ileso, mas Choy foi mortalmente ferido e abandonado em agonia em um dos becos de Chinatown. Apesar de ter ordenado o sequestro com forte apoio da polícia local, Yo Hing denunciou Yuen como o mandante da tentativa de assassinato e o mandou para a prisão. Foi estabelecida uma fiança no valor de dois mil dólares, uma quantia anormal para a época, especialmente para um chinês. A intenção era fazer seu rival apodrecer na prisão pelo tempo necessário para engordar os bolsos de juízes e advogados, condená-lo à morte e apropriar-se de seu território. Mas Yuen percebeu o esquema e alegou ser capaz de pagar a imensa quantia. Ele foi à sua casa acompanhado pela polícia, que descobriu que o dinheiro estava escondido no tronco de uma árvore, onde havia muito mais que o valor da fiança! Uma enorme riqueza resultante do tráfico clandestino, que atraiu não só os oficiais da lei.

Um dos agentes presentes naquela manhã de 24 de outubro de 1874 era um certo Jesus (!) Bilderrain, um policial de reputação macabra conhecido por ser ganancioso, ladrão e profundamente racista. Houve também várias queixas contra ele por crimes de roubo, principalmente de galos de briga. Ele também era um apostador inveterado e, junto com seu irmão Ygnacio, controlou e organizou os famosos blocos eleitorais contra a comunidade latina de Los Angeles em nome do Partido Democrata por anos, evitando assim que a minoria étnica votasse.


No entanto, esse sujeito foi visto como um exemplo de excelência. Jesus foi reverenciado como um herói pelos juízes e pela imprensa quando a investigação sobre o massacre teve início e suas palavras passaram a valer como ouro.


Ao contrário do que se acredita, na China, o ópio não era utilizado com as mesmas finalidades patológicas e viciantes como no Ocidente, mas sim para fins terapêuticos e religiosos. Foi apenas depois da queda do império Qing e das guerras anglo-chinesas de 1830 a 40 que a substância foi deliberadamente distribuída pela própria Inglaterra em grandes quantidades entre a população chinesa, a fim de aumentar seu monopólio e converter a maior parte das safras agrícolas necessárias em plantações de ópio, adequadas para exportação em todo o mundo. A China tentou conter a propagação, mas sem sucesso. Após as migrações para a América, o mau hábito e os tráficos a ele associados desembarcaram no Novo Continente administrados, de comum acordo, tanto pela máfia chinesa quanto pelo próprio governo dos Estados Unidos. Na foto, um salão de ópio chinês clássico de 1890. ia...

Bilderrain afirmou que, na noite de 24 de outubro, havia ido ao Negro Alley com outros homens, porque haviam sido atraídos por alguns tiros. Entrou em um beco, foi ferido e pediu a ajuda do agente Thompson, que foi morto por tiros disparados pelo próprio Yuen. O assassinato a sangue frio parece ter então incitado a multidão, que se organizou em pouco tempo e invadiu a área, levando ao massacre. Embora atroz, todo o episódio foi tratado como uma loucura generalizada causada por uma rixa contra os chineses, que aparentemente afundavam a cidade na fome e no vício, enquanto obtinham quantias fabulosas de dinheiro. Foi inclusive desenterrada a história de que os chineses estavam coletando essas somas em nome de um mandarim que tinha a ambição de tornar-se governador da Califórnia. Uma farsa que remonta à corrida do ouro, mas que foi considerada verdadeira por alguns livros da época e que infelizmente já havia sido usada como argumento para as famosas Leis Raciais, que determinavam que “nenhum chinês poderia testemunhar em julgamento contra um branco" .

Embora o massacre tenha ocorrido praticamente diante dos olhos de todo o mundo, graças também aos relatórios implacáveis escritos em tempo real por H.M. Mitchell, repórter do Star, o julgamento terminou rapidamente, absolvendo a cidade como "vítima do horrendo comércio chinês e do clima de violência de sua máfia". Não há dúvida de que poderes políticos influentes levaram ao arquivamento do caso, os mesmos que mais tarde usaram a memória do massacre para fazer cumprir a infame "Lei de Exclusão Chinesa", de 1882.

A verdade dos fatos, como sempre, é muito mais amarga e até banal. Na origem do massacre, que feriu profundamente a alma estreita e racista dos falsos moralistas da época, há ganância e roubo.


As autoridades estadunidenses, principalmente a polícia local, sempre mantiveram relações íntimas com a máfia chinesa. Detinham o controle exclusivo não apenas sobre o ópio e especiarias, mas, acima de tudo, sobre o comércio — oficial ou clandestino — de mão de obra e produtos chineses que eram importados para os Estados Unidos a baixíssimo custo. O que afetava negativamente os preços dos produtos nacionais, que, portanto, despencavam. Além disso, os grandes empreendimentos, como as ferrovias, que recebiam enormes subsídios do Estado, costumavam recorrer a trabalhadores chineses, preferindo-os aos americanos e europeus, porque custavam menos e trabalhavam em dobro. Durante a era dos primeiros sindicatos, os chineses foram usados como “fura-greves” pelos próprios empresários para vetar as reivindicações da classe trabalhadora. Tudo isso inflamou enormemente a opinião pública, que passou a ver os chineses como perigosos e inclinados à prática de concorrência desleal. A foto mostra a parte de trás de uma clássica loja de especiarias em Chinatown, na década de 1880. alia...

O escândalo que se seguiu à tragédia evidenciou o quão pobre e cruel era a alma dos protagonistas. Graças às inúmeras investigações e depoimentos de sobreviventes, sobretudo do próprio Hing, que colocou nas ruas provas documentais do conluio e de “favores” entre ele, a máfia e a polícia local. Em seguida, toda a documentação e as peças processuais foram arquivadas e todo a matança foi varrida para debaixo do tapete. Elas só tornariam a aparecer muitos anos depois, graças às pesquisas exaustivas dos historiadores e às conjunções favoráveis, que veem a China hoje como a grande potência econômica do futuro.

Para além de qualquer consideração possível, o interesse principal deste livro é informar e ajudar a tornar conhecidos os grandes acontecimentos do passado, ligados à velha América do Norte e sua relação primitiva com a comunidade chinesa. Portanto, direi apenas como as coisas realmente aconteceram naquela noite de 24 de outubro de 1882 em Chinatown.


Bilderrain e seus companheiros foram ao Negro Alley naquela noite para roubar o ouro de Yuen, um "favor" pedido pelo próprio Hing a fim de acertar as contas com o canalha do Yuen. A aliança e proteção de Hing, no entanto, não foram suficientes para salvar Bilderrain dos tiros dos capangas de Yuen que guardavam o beco. É preciso dizer que Bilderrain não era um xerife oficial, mas um dos muitos vigilantes autorizados pela própria polícia a "manter a ordem" no gueto. Por isso, as autoridades fechavam os olhos para os acordos privados entre os vigilantes e a máfia chinesa. Mais ainda quando tratavam-se de promover o tráfico clandestino ou assassinatos privados. Por outro lado, a polícia recebia grande parte dos lucros e controlava todos os eventos programados, graças a uma densa rede de informantes. Sendo assim, a polícia também havia sido informada das intenções dos vigilantes naquela noite. Sua única tarefa era observar, deixar acontecer e, se necessário, liberar o local de quaisquer obstáculos. O próprio marechal Frances Baker, chefe da polícia de Los Angeles, tinha acordos pessoais com a máfia. Sua especialidade era a recuperação de escravas chinesas que, às vezes, conseguiam escapar e tentavam embarcar clandestinamente rumo à Europa. As recompensas pelo ato heroico de resgate das mulheres pobres, legalmente acusadas de furto, eram muito altas. Assim, a ganância amarrou com um nó duplo a polícia a uma ou outra das gangues rivais, geralmente a que pagasse mais.

Com base nas declarações subsequentes de Yuen, que havia escapado do massacre, Bilderrain estava mesmo na companhia de Hing naquela noite e, por causa disso, abriram fogo contra ele. Em retrospecto, há de se acreditar nele. As duas facções da máfia viram-se então diante de um acerto de contas e a única tarefa da polícia era permanecer neutra.

Para isso, foram postos à espreita dois velhos conhecidos de Los Angeles. Policiais heroicos que já haviam se destacado em ações perigosas durante os distúrbios mexicanos, como a captura e o assassinato do bandido Tiburcio Vásquez. Chamavam-se Emil Harris e George Garde. A tarefa deles era ficar à vista sem se intrometer, aconteça o que acontecesse. Diante da multidão enfurecida, não só não levantaram um dedo, como ameaçaram aqueles que tentaram fazer algo para impedir os linchamentos, conforme testemunhos confiáveis. No entanto, eles nunca sentaram no banco de réus e mais tarde foram promovidos aos cargos mais altos da polícia.

Sabe-se que Thompson foi morto a tiros quase imediatamente. Um evento frequente e nada surpreendente em Chinatown, onde, na semana anterior ao massacre, foram registradas 44 vítimas nos becos, incluindo quatro policiais. Robert Thompson não era nenhum santo. Pelo contrário, a maioria o conhecia como um tratante, vigarista e agiota, bem como o dono do infame salão Blue Wings, cujo imperativo era sexo e drogas. Então O QUÊ desencadeou a ira de 500 pessoas naquela noite? Uma loucura que permitiu ao povo torturar, matar e mutilar a sangue frio dezenove pobres chineses capturados aleatoriamente, além de saquear, demolir e queimar grande parte do Negro Alley diante dos olhos da polícia e da cidade de Los Angeles? O que é surpreendente naquela noite não é apenas o eco de um homicídio cometido à luz do dia, mas também a extrema velocidade com que a multidão se organizou e como um só homem invadiu o bairro e a dividiu em grupos, cada um com uma tarefa específica. Saltou imediatamente aos olhos do mundo o fato de o massacre ter sido um evento premeditado em que várias figuras ilustres da cidade, bem como políticos proeminentes, haviam admitido por conta própria estarem envolvidos. Vamos a alguns nomes. A começar por H.M. Mitchell, repórter do Star, antigo xerife do condado e que depois se juntou à riquíssima família Glassel. Em suma, diz-se que ele havia se tornado líder do Partido Democrata também graças ao seu artigo sobre o massacre, o qual justificava ressaltando que a cidade era "vítima dos chineses e da ilegalidade".

E o que dizer do rico comerciante J.H. Weldon? Que logo após o episódio, foi beber em um bar local com a camisa ensanguentada e gritando de alegria: "Tô feliz! Esta noite matei três chineses”! Harris Newmark, um dos maiores e mais afortunados empresários de Los Angeles, confessou abertamente que viu Thompson no chão e foi para casa festejar. O QUÊ, ninguém sabe. Porém, o empresário não parecia alheio aos fatos. Principalmente quando foi descoberto durante o julgamento que ele tinha relações próximas com os policiais Celis e Kerren, por sua vez suspeitos de terem atirado em Thompson ou o jogado no beco onde sabia-se que os mafiosos estavam escondidos. E o que pensar do chefe de polícia Francis Baker? Afirmou no julgamento que em todo aquele alvoroço de gritos, torturas e incêndios, "naquela noite, depois de ter rodeado o edifício Coronel, onde os mafiosos haviam se refugiado, foi se deitar", deixando a cidade à mercê da multidão.


Uma imagem rara do massacre de Chinatown. As vítimas oficiais dos linchamentos foram dezenove, mas toda a área foi saqueada e queimada e muitos ficaram feridos. a...

A verdade dos fatos, os documentos processuais e toda a documentação de um julgamento simulado que mostrou a alma podre de uma cidade inteira só vieram à tona graças ao árduo trabalho de John Johnson Jr., que, 140 anos após o massacre, conseguiu obter acesso à famosa biblioteca de Hungtington.

Os dados mostram inequivocamente que a política, as instituições e os interesses privados estiveram na origem não só do massacre, mas também da crise econômica, do clima de desespero generalizado e do caos total no qual a Califórnia, e sobretudo a cidade de Los Angeles, havia mergulhado. Baseando-se em um substrato de racismo constitucional que privou os chineses de qualquer direito humano e de uma dimensão jurídica, foi fácil identificá-los como inimigos da comunidade e, consequentemente, manipular a opinião pública.

A VERDADE SOBRE O MASSACRE
Os antecedentes


Tudo começou em 1869, quando foi concluída a ferrovia transcontinental de Utah, a Pacific Transcontinental, que estava no centro de um gigantesco plano de reconstrução do governo dos Estados Unidos para impulsionar a economia após o desastre da Guerra Civil.

As transcontinentais, ou seja, a união da costa do Pacífico com o Atlântico, significavam comércio, expansão e riqueza em um período em que as grandes ferrovias começavam a espalhar-se timidamente pela Europa. O setor empresarial norte-americano era, conforme seu histórico, gigantesco e muito respeitado e foi um modelo para o sistema capitalista que se espalhou a partir de então. É claro que para tal negócio era necessário investir rios de dinheiro e o governo contraiu uma enorme dívida pública, contando com o fato de que voltaria a poder gastar com a venda do ouro. Graças ao sistema New York Gold Exchange, que tinha a função não só de favorecer o mercado livre, mas também de controlar o preço do ouro e mantê-lo estável.

Isso atraiu um bando de especuladores, como James Fisk e Jay Gould e outros canalhas como eles, que manipularam o então presidente Ulysses Grant. Fizeram-no confiar a tarefa principal de comprar e vender o metal amarelo a um de seus comparsas, o tal general Daniel Butterfield, que se tornou então o tesoureiro-chefe dos Estados Unidos. Ele convenceu Grant de que era necessário que o governo comprasse o metal, que então deveria ser colocado de volta em circulação para que a economia permanecesse estável. No entanto, Butterfield não o vendeu, mas comprou-o em nome de Gould e Fisk, o que causou uma forte alta dos preços e uma inflação perigosa.

Percebendo o golpe, o governo então vendeu quatro milhões de dólares em ouro em 24 horas, causando o colapso de seu valor. Obviamente, o infame mecanismo é muito mais complicado do que isso, mas espero que essa narrativa simples dos fatos dê uma ideia da tremenda crise econômica que ele gerou. Agravada ainda pelo subsequente escândalo da Pacific Transcontinental Railroad, que se descobriu, por sua vez, ter sido especulada com base em subsídios estatais, inflando absurdamente os relatórios de despesas e estabelecendo um verdadeiro monopólio sobre os territórios de sua competência, dos quais o Estado foi excluído.

A crise atraiu um grande número de investidores, bloqueou indústrias e forçou o fechamento de milhares de empresas. Entre diversos estados, a Califórnia, que havia acabado de concluir sua ferrovia, deixando milhares de desempregados nas ruas, foi um dos mais afetados. A maior parte dessa mão de obra era de chineses, contratados em massa pelas empresas graças às ações do governo, que, como vimos, organizava o tráfico da China, aliciando trabalhadores a preços baixos. Juntamente com os desempregados da ferrovia de Utah, eles amontoaram-se em Chinatown, o único lugar nos Estados Unidos capaz de recebê-los. Ali, a máfia providenciou para que fossem acomodados e passassem a trabalhar para ela. Exceto para o mercado clandestino e a importação de produtos orientais. Entretanto, havia pouco trabalho disponível e os únicos a sobreviver foram mais uma vez os chineses, que se adaptaram a trabalhar quinze horas por dia por alguns centavos.


Didascalia...Inaugurada em 1869, a Pacific Railroad era uma joint venture que envolvia duas grandes empresas criadas para esse propósito: a Union Pacific e a Central Pacific. Havia também um grande envolvimento do governo dos Estados Unidos. A construção da ferrovia, que unia dois pontos estratégicos para o comércio norte-americano, a saber, a costa atlântica com a Califórnia e o Pacífico, representou o início da era moderna não só para o país, mas para todo o mundo, abrindo caminho para o sistema ferroviário. Foi um empreendimento gigantesco, mas o escândalo que se seguiu sobre orçamentos "inflacionados" e subsídios estatais quase causou o colapso do sistema democrático americano, dado o envolvimento comprovado do presidente Ulysses Grant.

Pouquíssimas pessoas nos Estados Unidos estavam cientes das condições terríveis em que esses escravos modernos eram mantidos. Vinham sequestrados de sua terra natal, muitas vezes em nome dos Estados Unidos, ou imigravam para a América para escapar da fome. Com a família refém na China e as leis estadunidenses que, com a desculpa de coibir a introdução clandestina de mulheres

destinadas à prostituição, proibia as esposas de juntarem-se aos maridos, esses pobres coitados não tinham vida própria e estavam à mercê de três inimigos: a pátria, os Estados Unidos e a máfia, que trabalharam em uníssono para melhor explorá-los. A prosperidade das lojas em Chinatown era frequentemente fictícia e pouquíssimos realmente beneficiaram-se delas. Os rendimentos dos jogos de azar, das casas de ópio e das bebidas iam diretamente para as mãos da máfia, que por sua vez pagava uma boa parte às autoridades locais. Os próprios Estados Unidos engordavam os bolsos com o comércio de produtos chineses, que em 1870 passou também a incluir frutas, verduras, peixes e gêneros de primeira necessidade que eram "adquiridos" no exterior a custo baixíssimo. Diversas empresas locais fecharam as portas, porque não podiam competir com esses preços. Por volta de 1880, toda a economia nacional passou a depender das importações e exportações com a China. O país asiático, com base em uma filosofia oriental, segundo a qual “se não se pode derrotar o inimigo por fora, derrote-o por dentro," impôs um comissário para verificar "as condições de seus súditos em uma pátria estrangeira". Na prática, graças a sua máfia, a China garantiu o controle total da imigração chinesa nos Estados Unidos, a fim de superlotá-los com seus cidadãos e manter o país americano em uma espécie de sujeição velada. Para dar fim ao golpe e retomar o controle sem perder os benefícios do tráfico com a China, foram promulgadas as famosas Leis Raciais, às quais seguiu-se toda uma onda de livros, pôsteres e seminários sobre a “ameaça chinesa".


Didascalia...Afiado e incisivo, Thomas Nast criticou abertamente o sistema político norte-americano e suas leis raciais em um dos jornais de maior audiência da época, o Harper's Weekly. Aqui está um de seus desenhos, intitulado Go West Go East, no qual ele expõe as nocivas leis de Jim Crow.

Confiando no desejo inerente de manipulação do povo e e em seu racismo arraigado, o governo norte-americano definiu categoricamente os chineses como "indesejáveis". Privando-os assim de qualquer personalidade jurídica e concedendo total imunidade ao indivíduo, que, portanto, sentia-se autorizado a "fazer justiça por si mesmo".

O massacre de Los Angeles foi uma consequência direta desse mecanismo perverso. Como sempre acontece em tempos de crise, os mesmos governos que apontam um bode expiatório para encobrir seus erros são os únicos que acabam se beneficiando das guerras entre os pobres.

O incêndio de Chicago de 8 de outubro de 1871 completou o quadro. Foi um dos desastres mais trágicos dos Estados Unidos, em que toda a cidade de madeira foi arrasada, deixando os corpos carbonizados de 300 pessoas, 110 mil desabrigados e 18 mil edifícios, em memória dos quais restou apenas uma parede. A investigação que se seguiu determinou que tratava-se de um daqueles eventos nefastos desencadeados unicamente pela ira de Deus. Após terem abafado o suposto descuido de uma vaca (irlandesa), que dizem ter causado o incêndio ao derrubar uma lâmpada, o caso foi encerrado. Na verdade, boatos afirmavam que NÃO FOI a mão do destino, mas sim a mão humana que causou o incêndio, motivada por dinheiro e poder.

Muitas coisas não batem sobre esse incêndio, como a intervenção do corpo de bombeiros, que era considerado um exemplo de organização e vigilância para os Estados Unidos. Como eram empenhados em defender do fogo uma cidade de madeira em pleno desenvolvimento onde a média de incêndios era de dois por dia! O departamento estava muito bem equipado: em 1866 contava com onze caminhões completos, dois extintores manuais, treze

carrinhos flexíveis, empilhadeira com escada, 120 brigadas em tempo integral, 125 voluntários e 53 cavalos. Em 1871, também foi equipado com o modelo único do elevador de mangueiras Knocke-Pattent, uma torre d'água capaz de disparar e direcionar um jato de alta potência.

Isso mostra o quão experiente e equipado era o corpo de bombeiros, que combateu as chamas do famoso incêndio na noite de 8 de outubro de 1871. No entanto, existem pelo menos dois erros grosseiros e imperdoáveis do departamento, como perder completamente o controle sobre as chamas.


DidascaliaO grande incêndio de Chicago custou aos Estados Unidos cerca de 200 milhões de dólares na época. Aqui está uma imagem do Harper's Weekly de autoria de John Chapin, mostrando a ponte na Randolph Street completamente destruída pelas chamas....

O primeiro diz respeito ao atendimento emergencial: sabe-se que a brigada foi acionada SOMENTE duas horas após a primeira chamada e apenas porque muitas outras vieram em seguida.

O departamento justificou-se dizendo que “pensaram que a nuvem de fumaça relatada pertencia a outro incêndio, que havia sido apagado na mesma área no dia anterior”.

Muito estranho e quase grotesco, para bombeiros experientes. Além disso, nos anuários do departamento não há menção a um incêndio semelhante que, mais estranho ainda, tivesse sido originado em um depósito de madeira.

O erro seguinte foi absurdo: ao perceber que se tratava de um novo incêndio, o departamento enviou o socorro, mas em uma direção completamente diferente! Falou-se de "erro de comunicação" entre os funcionários, o que é incompreensível para pessoas acostumadas a trocar esse tipo de informação com rapidez e precisão! Outro detalhe, e um que não me cheira nada bem, é que o departamento interveio durante toda a manhã para resolver quatro pequenos incêndios criminosos na mesma área. Logo, eles a conheciam muito bem. COMO poderiam não ter pensado que o quinto incêndio do dia também pudesse ter sido originado ALI?

Seja como for, os erros foram fatais e, apesar dos esforços subsequentes e da colaboração das cidades vizinhas, a fúria do incêndio destruiu tudo. Quando inclusive o aqueduto foi queimado, a população percebeu que havia perdido a batalha contra o fogo. Nesse ponto, fica a dúvida: se o incêndio foi realmente criminoso, QUEM e POR QUÊ teria feito isso?


Didascalia..Uma foto rara do corpo de bombeiros de Chicago com uma das várias estações equipadas, em 1871, poucos meses antes do grande incêndio. O equipamento era muito moderno e de última geração para a época. É de se perguntar O QUE poderia ter originado esses erros grosseiros e fatais para a cidade..

Você deve saber que a grande maioria dos prédios no coração da velha Chicago eram decrépitos, formavam guetos e eram ocupados pela chamada escória, ou seja, todas as pessoas pobres de diferentes etnias que haviam encontrado refúgio ali. O vício, a máfia e a prostituição estavam presentes nesses edifícios e muitas vezes por meio dos clãs irlandeses, que eram bastante odiados e temidos.

Frederick Law Olmsted, o pai da arquitetura de Nova York, torcia o nariz para os prédios de Chicago, chamando-a de uma "cidade retrógrada feita de imigrantes, bares e casas de madeira, afogada em seus delírios de grandeza que a levaram a construir gigantescos blocos de apartamentos de estilo grosseiro e questionável“ (the Nation, 1870). Além disso, Chicago estava muito atrasada em seu processo de industrialização, o que prejudicava os Estados Unidos.

Como na era de Nero, o incêndio permitiu varrer tudo de feio, indesejável e promíscuo que atrapalhava Chicago em sua corrida rumo à modernidade e de que ela jamais poderia se ver livre sem aquele acontecimento fortuito. No final, o incêndio representou uma pechincha para a cidade, que se beneficiou da ajuda financeira do Estado e da iniciativa privada, que a reconstruíram da cabeça aos pés e que no mesmo ano sediou a primeira escola de arquitetura dos Estados Unidos — cujas figuras proeminentes haviam atuado como engenheiros militares na Guerra Civil — e finalmente inauguraram o Home Insurance Building em 1885, o primeiro arranha-céu do país!


Didascalia...O primeiro arranha-céu norte-americano em toda a sua majestade, o Home Insurance Building, concluído em Chicago em 1888. A grande obra de William LeBaron Jenney inaugurou a moda de edifícios altíssimos, um símbolo do poder estadunidense.

Em todo o caso, os três infelizes acontecimentos criaram o substrato favorável à tragédia de 24 de outubro de 1871, do qual mais da metade da cidade teve participação ativa, já no limite do descontentamento com os imigrantes chineses, agora taxados de fura-greves pela opinião pública.

Naquela noite, além das declarações de protagonistas como Bilderrain, que se retrataram e modificavam cada

vez mais suas versões, os fatos deram-se da seguinte forma: Bilderrain, armado até os dentes e junto com um pelotão de outros vigilantes — lembre-se, NÃO POLICIAIS, mas sim cidadãos comuns autorizados pelo xerife local a manter a ordem —, esgueirou-se até o beco da Negro Alley em direção à casa e à loja de Yuen. Algumas fontes citam a presença do próprio Hing entre eles, provavelmente como um guia. A intenção clara de Bilderrain era roubar o ouro escondido em um tronco, do qual todos haviam ficado sabendo apenas pela manhã. O esquadrão viu-se diante dos guarda-costas de Yuen, que, como sabemos, era um mafioso. Os guerreiros Tong começaram então a atirar em autodefesa e, de acordo com as regras já definidas entre a máfia e a polícia local, sem nunca sair do beco. Os confrontos privados, aliás, faziam parte da rotina e por isso eram regulamentados. A regra era que podiam “atirar uns nos outros o quanto quisessem, contanto que o fizessem em casa” e, na Negro Alley, isso acontecia TODOS OS DIAS. Havia também uma espécie de toque de recolher para todos os habitantes de Chinatown, que, de qualquer maneira, preferiam ficar bem trancados em casa depois das 20h. Apenas os estabelecimentos voltados aos vícios permaneciam abertos e o acesso a eles também era baseado em outras regulamentações, destinadas a preservar a segurança dos fregueses.

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0+
Дата выхода на Литрес:
17 декабря 2020
Объем:
224 стр. 74 иллюстрации
ISBN:
9788835412007
Правообладатель:
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