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Enfim, a vida de nosso jovem diplomata não era nada fácil: o aliado garantido do momento anterior podia muito bem tornar-se, em uma noite, o maldito e deplorável inimigo da manhã seguinte, o peão a eliminar do tabuleiro para evitar o impasse ou para possibilitar o roque, a peça a sacrificar para desferir o ataque final…

Após o verão de 1482, a virada da política pontifícia tornava-se evidente. A Santa Sé decidiu pôr fim à guerra e, por isso, Tristano foi enviado à corte dos Gonzaga para manifestar a mudança de intenção de Roma nos confrontos de Ferrara e Mântua. Ao mesmo tempo, gozando da hospitalidade dos patrões da casa e com livre acesso aos refinados ambientes do palácio, o vigoroso rapaz não podia permanecer insensível aos chamados das jovens cortesãs que desfilavam sugestivas para ele.

III
Alessandra Lippi

O encontro com Pietro Di Giovanni e a paragem de Prato

Nos primeiros sinais da aurora mantovana, Tristano, sua jovem amante nos braços de Morfeu, voltara ao quarto há pouco; ele tentava conceder-se um merecido descanso quando uma voz insistente sob a janela o trouxe para a realidade:

– Excelência… excelência… Meu Mestre…

Um soldado com um pequeno pergaminho em mãos exigia sua atenção urgentemente.

A missiva estava claramente em sigilo papal e ordenava que Tristano voltasse a Roma o quanto antes.

Assim, sem sequer esperar notícias do campo de batalha, o oficial pontifício devia deixar a cidade de Virgílio com sua escolta, mas não sem antes redigir duas rápidas mensagens: uma para o marquês Frederico, pedindo desculpas pela partida improvisada e confirmando o apoio do Santo Padre nos confrontos dele e do duque de Ferrara; a outra para sua Beatriz, agradecendo por compartilhar tão generosamente aquela noite e desejando que encontrasse aquele sonhado amor que seu prometido nunca pôde dar.

Cavalgou sem parar todo o dia, parando apenas em Bolonha para alimentar os cavalos, antes de atravessar o Apenino Emiliano ao redor de Florença.

No dia seguinte, atravessando um compacto e silencioso faial, o disparar de uma balestra cruzou o caminho do jovem, fazendo um bando de tordos e toutinegras alçar voo. Enquanto Tristano e seu grupo instintivamente puxavam as rédeas dos cavalos e pegavam nas armas, um cavalo marrom, exausto e sangrando pelo garrote, cortou a frente enlouquecido. Um homem e uma jovem cambaleavam em cima dele. Logo depois, outros quatro cavaleiros, e depois mais dois, claramente seguindo o primeiro.

Por impulso, o audaz embaixador decidiu unir-se à caça no denso bosque, forçando sua escolta a fazer o mesmo.

Assim que o bosque se abriu em uma clareira em declive, os três desaceleraram e, escondendo-se, tentaram compreender à distância o que acontecia.

O cavalo marrom havia caído; os dois jovens, no chão, tentavam em vão proteger-se em uma pequena cabana abandonada, mas já haviam sido alcançados e capturados; dois dos captores estavam desmontados e com espada em riste, enquanto os outros quatro cercavam a barraca.

Enquanto sua protegida usava toda a força para tentar abrir aquela porta velha, o homem, unus sed leo, preparava-se para enfrentar os dois capangas com uma forquilha. Apesar da evidente desvantagem numérica, conseguiu parar um deles com um chute na barriga, voltou-se de chofre para o outro, esquivando-se da espada, agarrou-a e enfiou-a no flanco. Obtida uma arma, olhou rapidamente para a mulher, no meio-tempo cercada pelo resto do bando, e retomou a luta com o primeiro brutamontes, conseguindo desarmá-lo e rendê-lo, apesar de seu tamanho. Enquanto isso, o desesperado grito de ajuda de sua companheira exigiu sua atenção; ao virar-se para a mulher, lançou a espada contra o peito do bruto que os atacava, mas recebeu uma flecha de balestra nas costas do último cavaleiro ainda montado; não pôde fazer mais nada depois que outras duas acertaram suas costas, e os vilões prenderam-no em uma malha metálica similar à usada na caça, atirando-o no chão e imobilizando-lhe subitamente os membros com uma cinta.

– Não, Pietro… – gritou a jovem desesperada – deixem-no! Sou eu quem vocês querem – rebentando em lágrimas.

– Parem – mandou aquele que parecia ser o chefe – não terminem logo. – E, apontando para a pobrezinha, continuou – primeiro nos divertimos um pouco.

– Malditos – gritou o homem rendido, que se contorcia inutilmente – canalhas, covardes, filhos da mãe!

A besta pegou a menina aterrorizada pelo cabelo e, arrancando o vestido, prendeu-a contra a parede da cabana, imobilizando-lhe os braços e, enquanto os outros dois amarravam-lhe as pernas com uma corda, baixou as calças, enfiando-lhe um pano na boca para abafar os gritos.

Naquele ponto, Tristano, não podendo manter-se indiferente a tão execrável violência, decidiu finalmente intervir: saiu com os seus do esconderijo e, irrompendo, atirou-se heroicamente contra aquela hedionda matilha de hienas lascivas. Os estupradores, mesmo com baixas, continuavam em número superior e não foram surpreendidos: a tensão aumentou novamente. No entanto, enquanto um dos agressores colocava as calças, Tristano reconheceu na barra da capa o emblema dos Médici e, antes que os atiradores preparassem suas balestras, alçando a mão ao céu, intimou-os:

– Parem, ordeno-lhes em nome do senhor Lourenço de Médici. – E regiamente estendeu o braço à frente, depois à direita e à esquerda, contra cada um dos quatro homens – Tenho 25 homens em minha companhia prontos para prendê-los e entregá-los às galés de meu amigo Lourenço – respondeu.

O maior de todos, então, reconhecendo no anel o emblema de seu senhor e temendo as sérias repercussões, ordenou que baixassem as armas; tentou também esboçar justificativas para o ocorrido, mas Tristano interrompeu-o imediatamente:

– Vá embora, delinquente.

Os quatro, sem mais ordens, montaram no cavalo e desapareceram no faial.

Os soldados pontífices, ainda incrédulos de como o jovem oficial resolveu a questão, soltaram rápido os jovens e, enfaixando as feridas como puderam, carregaram-nos até o dorso de um cavalo.

Retomou-se então o caminho enquanto o sol começava a baixar à direita.

De noite, chegaram em Prato, onde Tristano conhecia alguém que talvez pudesse cuidar dos dois feridos, permitindo-lhes continuar o quanto antes o trajeto para Roma.

Nos arredores da praça do Duomo, duas meninas acabavam de dar um pedaço de pão a um pobre pedinte com frio e se preparavam para voltar para casa. Tristano saltou de súbito do cavalo e, apontando para as duas jovens, exclamou:

– Alessandra!

A mais magra das duas voltou-se de chofre, observou um momento quem ousava chamar seu nome àquela hora e, confirmando com a vista a sensação que aquele som provocou em suas recordações, respondeu:

– Tristano.

Correu rápido a seu encontro e, livre de qualquer convenção ou inibição, como se estivesse entre jovens que já viveram de tudo juntos, envolveu os braços no ombro dele, estreitando de leve os olhos e apertando a cabeça no peito do inesperado forasteiro.

Alessandra era a graciosíssima filha da senhora Lucrécia Buti e do falecido pintor florentino Filippo Lippi. Sua mãe, um dia irmã Lucrécia, tornou-se freira no monastério de Santa Catarina, obrigada pela família a uma clausura forçada. Seu pai, capelão do convento no mesmo monastério, havia sido reconhecido em vida como um dos melhores pintores de seu tempo e, portanto, frequentemente, incumbido, pelas hierarquias eclesiásticas e pelas famílias mais abastadas, de retratar obras importantíssimas, sobretudo de temas bíblicos e hagiográficos. Foi durante um desses trabalhos que os dois se conheceram. A atração foi inevitável e irreprimível… ela muito bela e sensual, ele muito carismático e sensível: os dois religiosos apaixonaram-se perdidamente. A relação pecaminosa entre os sacros muros do convento durou algum tempo, durante o qual irmã Lucrécia se oferecia de modelo para alguns retratos de frei Filippo, até que este, durante a procissão do Cinto de Tomé, decidiu raptar sua amada e recomeçar com ela uma nova vida de concubinato, indiferente do furor, do escândalo e da reprovação geral. Obviamente, a Igreja dificultou o quanto pôde a relação dos dois, rotulando-a luxuriosa e mesmo diabólica; apenas anos mais tarde, graças à intervenção de Cosimo de Médici, protetor de Lippi perante o Santo Padre, os dois foram finalmente reabilitados e obtiveram a dissolução dos votos. Então, alguns anos mais tarde, nasceu a bela Alessandra.

Tristano conhecera e convivera com a desenvolta garota durante as estadias na adolescência em Florença, na casa dos Médici. Foi tomado de imediato, de alguma forma atraído, ainda mais do que pelo trato gentil e a mente aberta, pela extroversão e independência intelectual da garota, características que certamente herdara de ambos os pais, dos quais expressava intrinsecamente o modus cogitandi et operandi.

Agora a via depois de passado quase um lustro, ainda mais bela, ainda mais mulher.

Os dois entraram em casa enquanto o resto da companhia esperava fora.

Tomaram apenas o tempo para contar à dona da casa o que acontecera poucas horas antes, e os amigos saíram novamente, convidando os demais a acomodar-se. Alessandra, não obstante a hora, mandou chamar um médico e preparar quartos para os hóspedes e assegurou Tristano, generosa, que cuidaria, junto de sua mãe, de ambos os feridos até que se recuperassem.

Assim, enquanto um bom copo de vinho acompanhava as histórias do gentil hóspede e acentuava o rubor das bochechas da bela senhora da casa, Hipnos e seus Oniros desciam lentamente na cidade de Prato.

Na manhã seguinte, logo após as laudes matutinas, o jovem representante, agradecendo a hospitalidade, retomou com sua escolta o caminho para Roma, onde seu protetor esperava-o zeloso… e com mais uma missão a cumprir.

Era necessário, portanto, acelerar a viagem, evitando outros possíveis imprevistos.

A menos de cem passos da povoação, na poeirenta estrada para Florença, os três cavaleiros pontífices apenas começavam a apressar o passo quando foram alcançados por um homem a cavalo cheio de curativos nos braços e pernas.

– Senhor… senhor, lhe imploro. Pare…

O angustiado homem era aquele que Tristano salvou e entregou, junto de sua mulher, aos cuidados da casa de Lippi. O oficial pontifício teve de parar novamente.

– Imploro-lhe, meu senhor, que me escute – continuou suplicante. – O que o senhor fez é muito mais nobre que qualquer brasão que possa ornar seu peito e qualquer coroa que enfeite a insígnia de sua casa.

Descendo do cavalo, ajoelhou-se diante do diplomata:

– Permita-me demonstrar-lhe minha mais eterna gratidão e oferecer-lhe meus serviços para quitar em parte a inextinguível dívida que contraí no momento em que Vossa Excelência retirou a mim e minha mulher da ferocidade homicida daqueles monstros. Durante toda a noite, não pude deixar de pensar no que aconteceu e tomei minha decisão: se aceitar, ofereço-lhe, sem pedir nada em troca, minha humilde espada e juro-lhe fidelidade enquanto me permitir servi-lo.

A Tristano, devido ao importante ofício que desempenhava, não faltava proteção. Além disso, até então sempre esteve só… mas brotava dos olhos daquele homem uma luz especial e um senso de reconhecimento sincero, leal, desinteressado, fora do comum. Tanto que, sem que o humilde camponês dissesse mais nada, perguntou:

– Qual é o seu nome, insolente?

– Pietro di Giovanni, meu senhor – respondeu levantando a cabeça.

– Levante-se, Pietro. De nada servirá sua proteção contra a ira de meu senhor, devida ao atraso que você me impôs… Não tenho brasões ou insígnias ou casas a ostentar, mas prezo seu reconhecimento e aceito seus serviços. Agora, no entanto, se se preocupa tanto assim, antes que eu desista, suba no cavalo e vamos sem mais demora.

Assim, a esquadra retomou o caminho para a Cidade Eterna.

IV
O anel do Magnífico

Juliano de Médici e Simonetta Vespúcio

Pietro, homem maduro, áspero, com aparência desgrenhada, mas não tão rude, era muito hábil com a espada (com a herança do pai, havia frequentado a escola bolonhesa de Lippo Bartolomeu Dardi); tinha ótima técnica e, apesar de não tão jovem, bom preparo físico; não gostava de se dizer um mercenário, mas, como tantos outros, tinha ganhado seu pão trabalhando para um ou outro senhor, participando das tantas batalhas e lutas que aconteciam na península naquele tempo.

Durante a viagem, em um momento de marcha mais lenta, o espadachim aproximou-se de Tristano e, cuidando para nunca deixar o nariz do cavalo passar o de seu senhor, ousou perguntar:

– Vossa Excelência me permite uma pergunta?

– Claro, Pietro, diga-me – respondeu o distinto funcionário, virando a cabeça de leve para seu audaz ajudante.

– O que o senhor fez para conseguir aquele anel? É realmente o anel do Magnífico?

Tristano hesitou alguns instantes com um leve sorriso no rosto, mas, sabendo poder confiar naquele homem, que conhecia há poucos dias, mas já estimava tanto, deixou a desconfiança de lado e começou seu relato:

– Passaram-se sete anos desde quando o cardeal Orsini me levou a Florença pela primeira vez, acompanhando uma delegação médica criada especialmente para assistir Sua Excelência Reverendíssima Rinaldo Orsini, arcebispo de Florença, doente e sem sinal de melhora há duas semanas. Chegando à cidade, enquanto o physicus e seus aprendizes – entre os quais estava também meu amigo Jacopo – foram logo enviados à diocese para cuidar do paciente, o cardeal me levou consigo à casa da senhora Clarice, sua sobrinha e esposa de Lourenço de Médici, o Magnífico Senhor.

Ainda posso lembrar o olhar doce e materno com que dona Clarice me acolheu, oferecendo-me a mão. Apresentou-me a seus familiares e amigos e logo me pôs todos os confortos da casa à disposição. Toda noite, seus banquetes tinham convidados letrados, humanistas, artistas, refinados cortesãos e… principalmente belas mulheres.

A mais bela de todas, à qual até hoje nenhuma consegue igualar-se e destronar, era Simonetta Cattaneo Vespúcio.

A noite em que a vi pela primeira vez, vestia uma sobreveste de brocado forrada com veludo vermelho, que deixava à mostra um generoso decote, e lindamente delineada por uma gamurra preta, que se amoldava perfeitamente aos belos seios e preservava a suave forma daquele admirado e desejado corpo. Caíam soltos sobre os ombros a maior parte dos louros cabelos ondulados, enquanto uma parte estava recolhida em uma longa trança decorada com cordéis e pequenas pérolas. Alguns cachos rebeldes enquadravam aquele rosto harmonioso, fresco, radiante, etéreo. Seus olhos eram grandes e melancólicos, sensualíssimos, assim como aquele sorriso esboçado nos aveludados lábios semiabertos, exaltados pela covinha no queixo e tão vermelhos quanto a sobreveste.

Se eu não tivesse recebido a terrível notícia de sua morte algum tempo depois, ainda acreditaria que ela era uma deusa encarnada em um perfeito invólucro feminino.

Tinha apenas um único defeito: já tinha marido… ciumentíssimo e com razão. Com apenas 17 anos, casou-se em sua Gênova natal com o banqueiro Marco Vespúcio, com a presença do doge e de toda a aristocracia da república marítima.

Era muito amada (e invejada) pela sociedade; durante os anos, tornou-se a musa favorita de muitos literatos e artistas, entre os quais o pintor Sandro Botticelli, amigo de longa data da família Médici. O pintor apaixonou-se platonicamente por ela e pintava seus retratos em todos os lugares: até o estandarte que fez para a justa daquele ano, vencida por Juliano de Médici de maneira épica, continha seu etéreo rosto.

No dia seguinte, fomos convidados a um banquete na vila de Careggi organizado pelo Magnífico em homenagem à família Borromeo. O intuito velado era apresentar uma das filhas destes a seu irmão Juliano, o qual, no entanto, como talvez tantos outros, havia perdido a cabeça pela senhora Cattaneo. Inclusive, depois das primeiras formalidades, Juliano retirou-se ao jardim, onde esperava a esposa de Vespúcio, aproveitando-se da ausência do marido, que estava em uma viagem oficial naquela manhã.

Entre um prato e outro, Lourenço deleitava seus hóspedes declamando preciosos sonetos de sua própria composição. Fazendo coro à declamação, alguns ilustres convidados respondiam à rima, animando o simpósio. Além de nobres amigos e familiares, sentavam-se à mesa estimados acadêmicos neoplatônicos como Marsílio Ficino, Ângelo Ambrogini e Pico della Mirandola, além de diversos expoentes do Conselho florentino.

Embora fosse o chefe da família mais rica e potente de Florença e estivesse se tornando, cada vez mais, o incontestável árbitro do equilíbrio político da península, Lourenço tinha apenas 26 anos; teve o mérito de construir em torno de si uma corte jovem, brilhante, mas também prudente e capaz. Após poucos dias de convivência, tornou-se para mim um modelo a seguir, a personificação de valores a aspirar. O que claramente nos diferenciava e que jamais poderia igualar, além dos 11 anos de idade, era o fato de ele poder contar com uma sólida e coesa família: sua mãe, dona Lucrécia, era, ainda mais depois da morte de seu cônjuge Pedro, sua onipresente cúmplice e conselheira; Bianca, doce e amada irmã, admirava o irmão e não perdia a oportunidade de tecer-lhe elogios, brilhando-lhe os olhos sempre que pronunciava publicamente seu nome; Juliano, obstinado irmão mais novo, apesar de eventuais tensões e impertinências, também estava sempre a seu lado, envolvido em cada sucesso ou insucesso político do irmão; Clarice, embora conhecida por algumas indiscrições conjugais, nunca deixou de amar o marido e sempre o apoiaria contra todos, mesmo contra sua família de origem, se necessário fosse. Era bonito ver aquela corte familiar em torno da qual a cidade, com elegante subordinação e reverência, apertava-se em cada festa, em cada celebração, em cada banquete. Aquela foi uma ocasião exemplar disso, a qual, como outros, tive o privilégio de presenciar.

Mas antes que o confeiteiro fizesse sua grande entrada no salão, ouvi um cão latindo fora da vila e decidi por instinto sair para ver por que o animal queria chamar a atenção de seus senhores. Ao entrar no jardim, descobri incrédulo Juliano e Simonetta debatendo-se no chão, sem controle dos próprios membros: a senhora Vespúcio, o rosto corado, os olhos e a boca abertos, tremia como vara verde; seu amante, ao contrário, tentava tapar o corpo, alternando entre risadas e delírios. Sem demora voltei para dentro e, aproveitando uma pausa nas festividades, com máxima discrição, pedi que Lourenço me seguisse.

Vimos os dois corpos sem vida caídos no chão. Lourenço mandou-me chamar um médico imediatamente; embora sacudisse o irmão mais novo, este não reagia de absoluto, nem aos golpes, nem às vozes. Logo depois, começaram as convulsões.

A situação era crítica e muito delicada. Em alguns instantes, no semblante do Magnífico a emoção e o desconcerto transformaram-se em pânico gerado pela impotência. Embora quisesse pedir ajuda a qualquer um presente na casa que pudesse oferecê-la, sabia que a descoberta dos dois jovens naquela condição, além do enorme escândalo, teria significado a perda do importante apoio político de Marco Vespúcio a si e sua família, o que era, naquele momento, decisivo no Conselho já minado pelos Pazzi (o nobre Jacopo de Pazzi, sem sombra de dúvida, aproveitaria a situação para tomar o controle da cidade).

Nem a imediata chegada do médico e do boticário tranquilizou Lourenço, que continuava a questionar-me sobre o que eu tinha visto antes de ele chegar. Os doutores, embora desde o início desconfiassem de um envenenamento, não conseguiam identificar a substância responsável para poder indicar um remédio. No meio-tempo, chegou Ângelo Ambrogini, o único, além de sua mãe, em quem Lourenço confiava cegamente; foi encarregado de pensar em uma desculpa aos convidados, que começavam a perceber e apontar a ausência do chefe da casa. Com a ajuda de Ângelo, os corpos logo foram levados em segredo para um abrigo próximo.

Percebi então que onde antes jazia o corpo de Simonetta havia um cestinho com mel e frutas do bosque, tudo aparentemente comestível e inofensivo. Peguei com a ponta dos dedos um mirtilo e apertei-o. Num instante lembrei-me que Jacopo me mostrou em Roma, alguns meses antes, uma planta muito venenosa chamada "atropa", também conhecida como "cereja de Satã", cujos frutos eram muito parecidos com o comum mirtilo, embora letal mesmo em pequenas quantidades. As folhas de atropa maceradas são comumente usadas pelas mulheres para dar brilho ao olhar e dilatar a pupila, para ficarem mais sedutoras. Minha hipótese foi aventada pelos médicos e confirmada pelo fato de que ambos os moribundos apresentavam manchas escuras nos lábios. No entanto, o cientista sentenciou que, naquele caso, não havia nenhuma cura conhecida, lançando o dono da casa na mais desesperada resignação.

O ocorrido foi aclarado alguns dias depois: alguém, a mando de Francesco de Pazzi, havia substituído os mirtilos pela atropa naquele cesto de frutas que dona Vespúcio viria a dividir com seu amante. Juliano, portanto, envenenou-se em um jogo erótico, chupando os frutos venenosos diretamente da boca da bela Simonetta. Assim, depois de alguns minutos, a potente droga fez efeito.

Ainda horrorizado pelo ocorrido, ousei intrometer-me uma segunda vez e propus ao senhor Lourenço um derradeiro esforço, consultando a delegação pontifícia hospedada na diocese. O magnífico, fazendo-me prometer a máxima discrição, consentiu e mandou-me buscar Jacopo com pressa, com quem voltei em seguida. Meu amigo analisou os frutos e ministrou um antídoto vindo de desconhecidas terras africanas. Depois de cerca de uma hora, os sintomas amenizaram, a temperatura dos doentes começou a baixar e, em oito dias, os jovens estavam completamente recuperados.

Todos os suspeitos foram afastados, dentro e fora dos muros. Quando Marco Vespúcio retornou à cidade com seus banqueiros, não tomou conhecimento de nada: ele estava ainda mais rico, Simonetta estava ainda mais bela, Juliano ainda mais apaixonado… mas, acima de tudo, Florença pertencia ainda mais aos Médici.

Até o arcebispo parecia recuperar-se aos poucos; preparamo-nos, portanto, para retornar a Roma. No entanto, o Magnífico, como gesto de afeto e estima, além de agradecimento e reconhecimento, honrou-me com este que todos consideram uma das maiores condecorações da república: o anel de ouro com seis bolas, um passe universal entre os territórios da cidade… e não apenas lá.

Desde então, sempre o carrego comigo, como um precioso testemunho da amizade de Lourenço e eterna memória daqueles infelizes amantes que, como Páris e Helena, muitas vezes correram o risco de transformar Florença em Tróia.

Durante toda a narração, Pietro, fascinado e tomado pelos fatos extraordinários, pela oratória do narrador e pela riqueza dos detalhes, não ousou dizer palavra.

Esperou alguns segundos depois do alegre fim para certificar-se de não estar profanando o incrível conto e, contraindo seu semblante impassível, finalmente disse orgulhoso:

– Obrigado, Senhor. Servir-lhe não será apenas uma honra, será um prazer.

Depois de dois dias na estrada, a via Cássia revelou o esplendor de Roma. Embora homens e animais estivessem bastante cansados, diante daquela visão, os ânimos revigoraram-se, e os corpos recuperaram a força. Tristano acariciou o cavalo e apressou o passo.

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669,35 ₽
Возрастное ограничение:
0+
Дата выхода на Литрес:
21 августа 2020
Объем:
211 стр. 2 иллюстрации
ISBN:
9788835409922
Правообладатель:
Tektime S.r.l.s.
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